Juarez Quadros: A migração da TVRO via satélite da Banda C para a Banda Ku no Brasil
Por Juarez Quadros do Nascimento* – No contexto tecnológico, vários satélites cobrem os países com as Bandas C, Ku, Ka e outras. Todos autorizados e lançados às suas órbitas espaciais com as finalidades que lhes foram atribuídas nos seus projetos. No contexto social, em muitas localidades, o satélite é a infraestrutura complementar para as comunicações. Trata-se de uma solução eficaz e barata para áreas remotas, rurais ou de difícil acesso. E no contexto econômico, um satélite requer altos investimentos para atender governos, negócios e pessoas.
No Brasil, um país “satellite friendly”, a situação não é diferente. A necessária adoção da faixa de 3,5 GHz destinada à tecnologia de quinta geração móvel (5G), promovida pela Anatel, tem as suas vicissitudes ao exigir a migração e convivência de vários outros serviços, com impactos tecnológicos e socioeconômicos para as comunicações.
Com a destinação da faixa de 3,5 GHz para a tecnologia 5G serviços foram afetados, entre eles, a recepção do sinal de televisão aberta e gratuita por meio de antenas parabólicas na Banda C, conhecida como TVRO (TV Receive Only, em inglês). Daí a solução adotada de migrar a TVRO da Banda C para a Banda Ku, a ser utilizada pelas emissoras de TV nas frequências situadas entre 10,7 GHz/13,25 GHz e 17,3 GHZ/17,7 GHz.
O Anexo IV-A do Edital do Leilão de 5G da Anatel dispõe que os radiodifusores, em um determinado prazo, indicarão o(s) satélite(s) para o qual serão migrados os canais de televisão, obedecidos certos critérios, tais como: o(s) satélite(s) deve(m) estar devidamente autorizado(s) no Brasil; no caso de utilização de mais de um satélite, deve ser utilizada uma única antena para a recepção; e preferencialmente deve ser escolhido satélite que opere em faixas de radiofrequências atribuídas ao Serviço de Radiodifusão por Satélite, conhecido como BSS (Broadcast Satellite Service, em inglês).
Várias empresas ocupam recursos de órbita e espectro radioelétrico notificados pelo País, ou a ele distribuídos ou consignados, e concorrem entre si na exploração de diversos serviços via satélite. Entre elas, destacam-se Star One, Hispamar, SES, Eutelsat e Intelsat. O Edital do 5G, conduzido com mérito pela Anatel, recomenda o uso de faixas de radiofrequências BSS. Em fase com essa recomendação, os satélites da Star One e Hispamar atendem a esse atributo.
Concluído o leilão de 5G e assinados os contratos com os vencedores, mediante um chamamento público da Anatel, cerca de 140 radiodifusores apresentaram-se como interessados em migrar a TVRO da Banda C para a Banda Ku.
Agora, eles terão que decidir qual modelo lhes interessa entre as soluções possíveis, tais como: locação de capacidade de transmissão espacial e operação de um “headend” de TV versus um novo uplink proprietário de banda Ku em cada emissora; e a contratação de um serviço gerenciado junto a uma operadora que, também, possa oferecer infraestrutura de “headend” e uplink neutro. Além disso, há a opção de combinar a TVRO com o serviço de acesso condicionado (SeAC).
Atualmente, Star One, Hispamar e SES oferecem as opções descritas. A questão decisiva será o custo. Certamente os radiodifusores optarão pela solução que lhes for mais competitiva. Nisso, as operadoras têm muito a oferecer. Além do mais, Star One e Hispamar podem oferecer solução em dois satélites. Esta opção seria viável desde que os dois satélites estejam em posições orbitais não superiores a 10 graus de espaçamento, o que permitiria recepções em uma única antena, como manda a Anatel. Testes confirmam essa possibilidade de oferta às emissoras com vantagens competitivas e robustez à operação. Contudo, aumentaria o custo do equipamento receptor a ser instalado, da ordem de R$ 25 a R$ 40 por domicílio.
Levando em conta que no Brasil, a recepção de TVRO ocorre para 20 milhões de domicílios; dos quais, para oito milhões deles serão necessários equipamentos supridos com recursos do leilão do 5G. Tal ação ocasionaria um custo entre R$ 200 milhões e R$ 320 milhões. Escolhida a opção de dois satélites, seria possível combinação entre Star One e Hispamar de modo a oferecer uma solução na Banda Ku/BSS.
Dada a possibilidade de antecipação do início do 5G, na faixa de 3,5 GHz, em áreas geográficas onde não haja recepção de TVRO nessa faixa; a brevidade necessária para a migração da Banda C para a Banda Ku e a disponibilidade de facilidades para a migração são requisitos fundamentais para a antecipação. Para tanto, Star One e Hispamar dispõem de teleporto no Brasil prontos para uma rápida migração. De modo contingente e redundante, a Hispamar dispõe de outro teleporto, um dos mais importantes da América Latina no Peru.
Isoladamente ou de modo combinado, o uso dos satélites da Star One e Hispamar são atrativos para fornecer uma boa solução técnica à migração de TVRO para a banda Ku/BSS. A considerar que, no Brasil, a Star One é uma empresa com uma longa história e a Hispamar é uma empresa com atuação em contínuo histórico de crescimento há duas décadas.
A possibilidade de utilização de mais de um satélite é uma solução viável, mas pode não ser a melhor opção. Diante da condição de uso de um único satélite, aliando observância aos requisitos operacionais e de boa técnica aos melhores preços, converte-se em uma boa solução, na medida em que, por conter um alto componente social no Brasil, o serviço de TV por satélite deve ser protegido contra situações climáticas adversas.
Considere-se ainda que, havendo capacidade espacial disponível e suficiente para a demanda atual e futura, um único satélite seria tecnicamente mais simples, economicamente menos oneroso e, portanto, mais eficiente em termos de custos; em função da simplificação de estações, antenas e equipamentos de solo; a tornar mais simples e rápido o processo de migração para a banda Ku; e, também, permitir soluções de contingência e redundância em caso de eventuais falhas sistêmicas.
(*) Juarez Quadros é Engenheiro Eletricista. Foi ministro de Estado das Comunicações e presidente da Anatel.