Empresas e entidades reclamam de restrições propostas para uso de FIP na Lei de Informática
A falta de previsão para os custos administrativos é uma das principais críticas de empresas e entidades ao texto da consulta pública do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações da minuta de portaria para regular a aplicação de recursos incentivados da Lei de Informática em startup por meio de fundos de investimento. A possibilidade desse tipo de investimento faz parte da atualização da lei, aprovada este ano, que destaca a obrigatoriedade desses fundos em serem autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e se destinarem à capitalização de empresas de base tecnológica.
O texto proposto manda que o investimento deverá representar no mínimo, o valor total de cotas integralizadas no FIP por empresa beneficiária da Lei da Informática. Porém, a Embraer argumenta que não se pode desconsiderar as despesas dos fundos, como pagamento de taxas, custos de gestão e de administração, que podem chegar a 20% do capital aportado. Dessa forma, sugere que a obrigação de repasse seja de no mínimo 80% do valor total de cotas integralizadas no FIP por empresa beneficiária da Lei n 0 8.248/1991.
A mesma sugestão foi apresentada pela Positivo Informática, que também defende a exclusão do artigo que proíbe a empresa beneficiária da Lei nº 8.248/1991 em possuir mais de 35% do total de cotas subscritas do FIP. Segundo a empresa, o artigo 15 da Instrução CVM 578 não prevê limitação para cotista único. “Vemos grande dificuldade em conciliar interesses estratégicos de cotistas diferentes e concorrentes”, argumenta.
A Embraer também discorda do artigo, alegando que o mercado de venture capital tem dificuldade de entender que não faz sentido nenhum para uma corporação investir em um FIP que não tenha alguma relação com sua estratégia, mesmo que seja só para cumprir obrigação de uma Lei. “Neste caso (por obrigação) a corporação vai preferir outro tipo de alocação (outro tipo de projeto que não fundo), mas que tenha ou faça algum sentido estratégico”, ressalta. Para a empresa, o recomendável é de possibilitar que as corporações tenham fundos exclusivos que atendam a sua estratégia de negócio, utilizando os recursos incentivados pela lei (35%), mais outros recursos próprios (65%).
A Assespro, além da questão do custo administrativo dos fundos e da limitação das cotas subscritas, defende ainda a redução da participação do FIP no processo decisório prevista na minuta da portaria, adequando-a a instrução 578/2016 da CVM. A entidade também ressalta a importância dos relatórios e informações sejam repassados ao MCTIC sempre por meio eletrônico.
A Abinee, por sua vez, acrescenta outras sugestões, além daquelas já apresentadas por outras empresas e entidades. Para a associação a vedação ao investimento em outra beneficiária somente faz sentido caso a própria empresa ou outro cotista (também beneficiário) do mesmo fundo seja seu controlador, direto ou indireto, para que seja evitada a multiplicação de beneficiárias de um mesmo grupo econômico investidas pelo mesmo fundo. “Assim, sugerimos a inclusão de trecho que impeça os investimentos em empresas beneficiárias apenas caso o próprio investidor ou outro cotista beneficiário do mesmo fundo seja controlador da investida”, propõe.
A Samsung, em outra frente, se preocupa com a determinação contida no artigo 11 da minuta de portaria, que prevê a satisfação da obrigação de aplicação do recurso em FIP quando da integralização das cotas do fundo de investimento. Segundo a fabricante, devido à sistemática legal de chamadas de capital da indústria de fundos de investimento, que ocorre conforme a demanda das operações de investimento, o tempo da integralização das cotas dentro do período de investimento não pode ser previsto de forma antecipada. “Tal cenário impossibilita que as empresas beneficiárias tenham uma programação para se valer do benefício em questão. Dessa forma, a satisfação da obrigação de aplicação do recurso em FIP deve ocorrer no ato de subscrição das cotas, mediante assinatura de boletim de subscrição”, recomenda.
Já a Qualcomm acrescenta mais um ponto: a obrigatoriedade de realização de due diligence nas potenciais sociedades investidas previamente ao efetivo aporte de recursos pelo fundo. A empresa entende que não é necessário tal exigência pelos seguintes motivos: a responsabilidade fiduciária do gestor do fundo perante os cotistas já influencia a tomada de decisões quanto às empresas que receberão o investimento; e grande parte das startups não possui documentação ou histórico que permita a realização de uma auditoria aprofundada, o que não significa, contudo, que esta determinada empresa representa um investimento ruim.
Além do mais destaca que, ainda que mantida a obrigatoriedade expressa de realização de due diligence pelo fundo, a forma posta não prevê os seus desdobramentos – seria, inclusive, impossível fazê-lo diante do caráter único de cada operação de investimento. “Outro ponto que deve ser considerado é que, tal como previsto, o processo se tornaria mais burocrático”, reforça.
Responsabilidade
As firmas de advocacia, como a NBF, se preocupam com a responsabilização das empresas beneficiárias da lei, no caso de descumprimento das normas, que pode desincentivar os investimentos no fundo. A sugestão é de transferir a responsabilidade primária para os próprios fundos. Defende também que a alteração da estratégia de investimentos ou fatos que levem à não observância dos requisitos da portaria deveriam ser considerados como fatos relevantes à empresa beneficiária, devendo ser reportados como tais pelo FIP. Proposta semelhante foi apresentada pela Associação Brasileira de Equity Crowdfunding (EQUITY).